terça-feira, 7 de setembro de 2010

Tentando Quebrar a Janela

O mundo é um quarto de hospital. Alvo, tranquilo e basta abrir as cortinas para ver o sol brilhar lá fora. Você está ali, mas é apenas uma fase, um estágio e logo você estará vivendo o esplendor do dia radiante que, por vezes, se oculta às cortinas. Você se esforça para melhorar rápido, para sair, você suporta a dor intermitente e os tubos entrando e saindo pelos mais diversos orifícios do seu corpo. “Vai ficar tudo bem”, diz a simpática enfermeira, irradiando bom humor. As pessoas riem, contam piadas, umas poucas estão pensativas, concentrando-se em ler o folheto do hospital.
A partir daí você começa a se acostumar, o soro é um membro do seu corpo, inseparável. Você tem muitos amigos, um em cada quarto pelo qual passou. Conversam sobre quando sairão do hospital, sobre o que farão depois e pactuam em se esforçar no tratamento. Numa dessas conversas, discutem a paisagem do lado de fora e, estranha, mas mágicamente tem visões completamente diferentes que acabam por se fundir e chegar à uma imagem parecida, dissonante nos pequenos detalhes.
Mas há algo ali que o incomoda, um barulho ocasional, violento, seguido por gritos animalescos. Com o tempo você descobre que há um homem que se recusa em seguir o tratamento, que não têm amigos e pouco fala. Ele é considerado um louco, mas como não é violento e é pouco sociável, fica misturado ao resto dos pacientes, pois o hospital não tem uma ala psquiátrica especial. “Ele está tentando quebrar as janelas novamente”, você escuta os comentários pelo corredor. “Louco, porque tentar sair de um lugar no qual até os médicos fazem questão de serem tratados?”.
Seus amigos mudam, chegam novos e dizem que os que não estão mais lá, estão curtindo a vida plenamente. Você fica satisfeito, não vê a hora de chegar sua vez. Faz planos de ligações, viagens. Descanso, enfim.
E quando a hora finalmente chega, você está radiante, te levam à uma sala. Extasiado, você não percebe as feições incolores das pessoas com quem tem contato naquele dia. O procedimento final tem início, você é anestesiado única e exclusivamente pela esperança. Ah, que sedativo poderoso! De repente, um barulho. Maldito homem tentando quebrar a janela. Dane-se, que importa nesse momento?! Mais batidas.
Estão segurando a sua a mão. Silêncio.
Preto.

2 comentários:

Unknown disse...

uh,,, um tom forte como o de Liev Tolstoi,,,

rbmarliere disse...

O amigo em cima disse tudo.